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 Com 68 observadores em todas as províncias do país, o Consórcio Eleitoral “Mais Integridade” observa, desde 20 de Maio de 2023, as operações de recenseamento eleitoral em curso, testemunhando o processo de inscrição de mais de 7.700 eleitores através de 625 visitas a 474 postos de recenseamento em 27 municípios. Isto representa uma cobertura até ao momento de 11% dos 4.292 postos de recenseamento existentes no país.

Aqui é apresentada a avaliação, pelo Consórcio “Mais Integridade”, da primeira semana das operações de recenseamento nos postos visitados pelas equipas de observação do Consórcio.

Em geral, os observadores credenciados tiveram livre acesso a todos os postos de recenseamento visitados e à informação necessária para a realização do seu trabalho, salvo raras excepções em que brigadas de recenseamento, por desconhecimento da lei, tentaram impedir o acesso dos observadores aos postos.

No entanto, até ao fim do dia 19 de Abril, véspera do início do recenseamento, apenas as Comissões Provinciais de Eleições da Zambézia, Niassa, Manica e Inhambane tinham emitido credenciais aos nossos observadores. As restantes Comissões Provinciais foram emitindo as credenciais muito lentamente ao longo dos dias seguintes, o que impediu nessas províncias uma observação com a qualidade e profundidade desejadas. As últimas credenciais só foram entregues no dia 27 de Abril, sete dias após o início do recenseamento eleitoral. Este caso deu-se na província de Nampula. Em Gaza, Sofala e Cabo Delgado, as credenciais foram disponibilizadas no dia 25. Na província de Maputo, foi no dia 24, na cidade de Maputo, no dia 21 e, em Tete, no dia 20.

 

Principais observações:

Operacionalidade, condições e ambiente de funcionamento e eficiência

Dos 474 postos observados, a grande maioria (90%) iniciou as operações de recenseamento às 8H00 do dia 20 de Abril. A indisponibilidade ou inoperacionalidade do equipamento foi a principal razão para os restantes 10% não terem começado a funcionar à data e hora previstas. 

A maioria das visitas pelas equipas de observação encontrou grande afluência de cidadãos e um ambiente ordeiro, embora a morosidade no atendimento tenha causado perturbação da ordem, inclusivamente com casos de interrupção das operações, em cerca de 5% dos postos visitados.  

Quatro dias após o início do processo, começaram a ser reportados incidentes de violência, em alguns municípios. No domingo, dia 24, fiscais da Frelimo e da Renamo envolveram-se em violência no Município de Angoche, província de Nampula. Na cidade de Nampula, também houve agressões entre fiscais da Frelimo e da Renamo.

De acordo com o Boletim sobre o Processo Político em Moçambique, uma publicação do Centro de Integridade Pública (CIP), em Chimoio, província de Manica, um fiscal da Renamo também foi agredido, no dia 24, por agentes da Polícia da República de Moçambique (PRM). De acordo com a publicação, o fiscal estava a tentar impedir o recenseamento de indivíduos residentes fora do perímetro municipal.

As equipas de observação notaram que a maioria (90%) dos postos visitados reunia condições básicas de funcionamento, embora cerca de 10% tenham sido considerados demasiado pequenos e vulneráveis a situações de mau tempo.

A maioria das visitas efectuadas pelos observadores encontrou os postos abertos e a funcionar – apenas 5% estavam encerrados no momento da visita, mas em 20% dessas visitas os postos estavam temporariamente inoperacionais devido a problemas de funcionamento de equipamento ou de falta de material, mormente impressoras e boletins de inscrição.

Durante 48 visitas – 8% das visitas efectuadas, as operações de recenseamento sofreram interrupções: em 60% dos casos por inoperacionalidade de equipamento e em 25% dos casos por protestos dos cidadãos contra a morosidade do processo.

Nas situações de interrupção por inoperacionalidade de equipamento ou falta de material, a principal reacção das brigadas foi comunicar o problema ao STAE e aguardar por assistência.     

As equipas de observação consideram que, em geral, as brigadas de recenseamento tinham um domínio razoável da utilização do equipamento e dos passos do processo de inscrição e que este domínio foi melhorando ao longo da semana. Nos 10% das visitas em que se observou fraco domínio do equipamento por parte das brigadas, as principais fraquezas eram a operação do computador – 58% dos casos, e captação

das impressões digitais – 29% dos casos. Estas fraquezas contribuíram de sobremaneira para a morosidade do atendimento.  

Como resultado das avarias ou deficiências das impressoras dos cartões de eleitor, ou incapacidade das brigadas de as operar adequadamente, cerca de 4% (308) dos eleitores inscritos durante as visitas das equipas de observação não puderam receber o seu cartão no fim do processo de inscrição, ou receberam e tiveram que pedir a sua reemissão por má qualidade da impressão e falta de nitidez de elementos identificativos, sobretudo a fotografia e, por vezes, a impressão digital. Nestes casos, a maioria das brigadas observadas tirou nova fotografia e/ou imprimiu novo cartão.  

Foram, também, reportados vários casos em que as câmeras não conseguiram captar a imagem do rosto de pessoas idosas. Ilha de Moçambique, Matola Rio, Xai-xai e Ilha de Moçambique são alguns dos locais onde estes casos foram registados, na primeira semana do recenseamento, conforme será detalhado mais adiante.

Nos postos de recenseamento visitados pelas equipas de observação, o tempo médio de atendimento a cada cidadão foi de 7,5 minutos, o que pode ser considerado aceitável para a primeira semana do processo – em 2018, o tempo médio para todo o processo, em postos de recenseamento observados, foi de 5 minutos.

Em 63% dos casos em que as equipas de observação testemunharam o encerramento das operações às 16H00, na primeira semana do recenseamento eleitoral, ainda havia filas de cidadãos por recensear. A atribuição de senhas foi a principal medida para garantir a prioridade dessas pessoas no dia seguinte.   

 

Elegibilidade para inscrição

A legislação eleitoral indica que são elegíveis para inscreverem-se como eleitores, em 2023, todos os cidadãos moçambicanos que, à data da inscrição, tenham completado 18 anos ou completem-nos até 11 de Outubro de 2023, data das eleições, e que habitualmente residam nos distritos onde existem autarquias e na cidade de Maputo. A lei também estabelece os requisitos de identificação necessários para a inscrição.

Durante as visitas aos postos de recenseamento, as equipas de observação testemunharam 91 casos (equivalente a apenas 1% de todos os cidadãos recenseados durante as visitas aos postos) de cidadãos a quem foi recusada a inscrição. A principal razão para a exclusão do processo de inscrição (56% das exclusões observadas) foi a falta de qualquer tipo de identificação válida e 40% dos casos não eram residentes da área de cobertura do posto.

 

Inclusividade

As equipas de observação consideram que uma percentagem significativa (16%) dos postos de recenseamento visitados não são acessíveis a pessoas com deficiência.

A composição das brigadas de recenseamento demonstra uma presença notável de mulheres e jovens, pelo que é de elogiar o esforço feito pelas autoridades eleitorais neste sentido. É, também, de reconhecer o esforço de incluir pessoas com deficiência nas brigadas, embora haja espaço para uma maior inclusão. Do total de brigadistas encontrados nas visitas aos postos de recenseamento, 60% eram mulheres, 81% eram jovens (entre 18 e 35 anos) e 1,3% eram pessoas com deficiência.

A nível dos fiscais dos partidos presentes durante as visitas dos observadores, apenas 30% eram mulheres.

Na maioria das visitas efectuadas pelas equipas de observação, a regra da prioridade a mulheres grávidas e com bebés de colo, idosos e pessoas com deficiência, foi respeitada. No entanto, numa percentagem significativa, 21%, pelo menos uma destas categorias não recebeu prioridade, com mais incidência para as mulheres com bebés de colo e idosos.  

Conforme referido acima, por vários municípios do país verificam-se casos de exclusão de idosos do recenseamento eleitoral. As situações são associadas ao seu não reconhecimento facial pelas máquinas. Na Ilha de Moçambique, por exemplo, pelo menos quatro Postos de Recenseamento tiveram estes casos num só dia. Trata-se dos Postos que funcionam nas EPCs de Ampapa, Natemba, Muchelia e de Namiroto que, no dia 26, excluíram alguns idosos pelo alegado não reconhecimento facial. No mesmo dia, pelo menos três destes casos foram reportados pelo Boletim sobre o Processo Político em Moçambique na nova vila municipal da Matola Rio[2], na província de Maputo.

Ainda de acordo com o Boletim, no Posto que funciona na Escola Técnica da cidade de Xai-Xai, na província de Gaza, além do não reconhecimento facial, houve casos em que a máquina não reconheceu as impressões digitais dos idosos. Em Nacala Porto, a Renamo apresentou vários cartões de eleitor sem assinatura dos seus portadores, alegando ter-lhes sido negado esse direito pelos brigadistas, da mesma forma como a captação das suas impressões digitais.

 

Fiscalização e reclamações dos fiscais dos partidos

Os principais partidos políticos tinham fiscais numa percentagem significativa dos postos de recenseamento visitados pelas nossas equipas, mas há diferenças notáveis entre eles no nível de cobertura dos postos. A Frelimo tinha fiscais em pelo menos

81% dos postos visitados, a Renamo 73% e o MDM 49%. Um quarto partido tinha fiscais em alguns postos de alguns municípios de Nampula e da Zambézia.  

Durante as visitas aos postos de recenseamento, as equipas de observação testemunharam relativamente poucas reclamações apresentadas por fiscais dos partidos políticos – apenas 51. A Renamo apresentou a maior percentagem das reclamações - 57%, a Frelimo 31% e o MDM 8%. Em relação a dois terços das reclamações, as brigadas tomaram nota sem nenhuma acção subsequente ou rejeitaram-nas e um terço foi resolvido no momento ou comunicado às autoridades eleitorais.

 

Segurança

A presença de agentes da PRM foi visível em 96% das visitas efectuadas pelas equipas de observação aos postos de recenseamento e em 90% dos casos a sua presença foi descrita pelos observadores como discreta.

Em mais de metade dos postos visitados, após o encerramento diário das operações de recenseamento, os materiais e equipamentos ficam guardados no próprio edifício do posto sob guarda policial e em 36% são transferidos para outras instalações, onde ficam igualmente sob guarda policial. 

 

Comportamentos ilícitos:

Em vários Municípios, há queixas de os partidos políticos estarem a mobilizar pessoas de fora da área municipal para se recensearem.

Em Morrumbala, na Zambézia, a Renamo impediu o recenseamento de cerca de 20 cidadãos de fora da área municipal que, entretanto, seriam recenseados na EPC Fraqueza.

Na Beira, em Sofala, o MDM denunciou casos de recenseamento de pessoas residindo fora da área autárquica, alegadamente mobilizadas pela Frelimo, mas tal não pôde ser verificado pelos nossos observadores.

Em Alto Molócue, na Zambézia, um fiscal da Frelimo recenseou-se duas vezes, tendo sido descoberto, de acordo com o Boletim sobre o Processo Político em Moçambique, depois do segundo recenseamento, mas, embora a dupla inscrição configure ilícito eleitoral, ele continuou a exercer a sua actividade normalmente.

Em vários postos de recenseamento da cidade de Nampula, o recenseamento de cidadãos jovens era condicionado à apresentação de declaração do bairro, o que é ilícito. Casos deste género foram observados nos Postos das EPCs Maria da Luz

Guebuza e de Mutauanha, bem como da Escola Secundária de Teacane, ambas na cidade de Nampula.

No município do Gurué, província da Zambézia, um grupo de brigadistas foi filmado num armazém do STAE a imprimir cartões de eleitores na noite do dia 27 de Abril, num claro acto de ilícito eleitoral, independentemente das suas motivações. O Consórcio “Mais Integridade” notou com satisfação que a Comissão Provincial de Eleições da Zambézia classificou inequivocamente aquela acção como ilícita e que o caso será referido às autoridades da justiça para investigação e eventual punição. O Consórcio aguarda informação sobre o desenvolvimento deste caso.     

 

Acesso à Informação:

Em apenas 18% das visitas efectuadas pelas equipas de observação, as brigadas informaram aos inscritos sobre o período de exposição pública e verificação dos cadernos. Em mais de metade das visitas, as brigadas não deram nenhuma informação e noutros 28% desta informação foi partilhada apenas ocasionalmente.

Em vários municípios, as equipas de observação reportaram que os cidadãos e autoridades locais e comunitárias não têm informação sobre os postos temporários que serão operados por brigadas móveis de acordo com um calendário específico. Isto tem criado situações em que os cidadãos, por desconhecimento, deslocam-se a esses postos fora do calendário e não entendem por que está encerrado.  

 

Recomendações

À Administração Eleitoral:

  1. Agilizar a resposta aos pedidos de assistência técnica pelas brigadas nos casos de avaria ou inoperacionalidade do equipamento
  2. Providenciar assistência adicional às brigadas para um melhor processo e emissão dos cartões de eleitor
  3. Encontrar uma solução para a dificuldade de captação da fotografia de pessoas idosas
  4. Reforçar e fiscalizar a proibição do uso de “listas de cidadãos prioritários” nos postos de recenseamento
  5. Continuar a instruir as brigadas a respeitar a regra da prioridade às mulheres grávidas e com bebés de colo, idosos e pessoas com deficiência
  6. Desencorajar fortemente os brigadistas de envolverem-se em casos de suborno
  7. Reforçar a instrução às brigadas de informarem os inscritos sobre o período de exposição pública e verificação dos cadernos
  8. Reforçar a informação às comunidades e líderes locais sobre a possibilidade de existência dos postos temporários e o seu calendário de funcionamento
  9. Informar as brigadas de recenseamento sobre a observação eleitoral e os direitos dos observadores eleitores

Aos partidos políticos:

  1. Instruir os seus fiscais, membros e apoiantes, a absterem-se de actos de violência e usar apenas os meios legais para resolver litígios
  2. Aumentar o número de mulheres como fiscais.

Exortação

O recenseamento eleitoral é uma fase crucial do processo eleitoral, pois é ele que permite a inscrição dos cidadãos como eleitores e é a condição de eleitor inscrito que permite o cidadão votar e ser candidato. Por isso, o Consórcio Eleitoral “Mais Integridade” exorta todos os cidadão elegíveis, que tenham 18 anos ou que os cumpram até 11 de Outubro deste ano, e residam nos distritos onde existem autarquias e na cidade de Maputo, a deslocarem-se aos postos de recenseamento mais próximos aos seus lugares de residência habitual para inscreverem-se nos cadernos de eleitores e assim receberem o seu cartão de eleitor.

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O Consórcio Eleitoral “Mais Integridade” está a observar o recenseamento eleitoral nos seguintes municípios: Cuamba e Insaca, na província de Niassa; Montepuez, Mocímboa da Praia, Pemba e Chiúre, na província de Cabo Delgado; Cidade de Nampula, Ilha de Moçambique, Nacala-Porto, Angoche e Malema, na província de Nampula; Quelimane, Mocuba, Gurúè, Alto Molócue e Morrumbala, na província da Zambézia; Moatize, na província de Tete; Guro, na província de Manica; Beira e Marromeu, na província de Sofala; Massinga, na província de Inhambane; Chókwè, Mandlakazi e Massingir, na província de Gaza); Matola e Matola-Rio, na província de Maputo, e Cidade de Maputo.

O Consórcio irá observar todos os actos do processo eleitoral de 2023, incluindo o recenseamento, a campanha, a votação e o apuramento, até à promulgação dos resultados pelo Conselho Constitucional. O Consórcio Eleitoral “Mais Integridade” é composto pela Comissão Episcopal de Justiça e Paz (CEJP) da Igreja Católica, Centro de Integridade Pública (CIP), Núcleo das Associações Femininas da Zambézia (NAFEZA), Solidariedade Moçambique (SoldMoz), Centro de Aprendizagem e Capacitação da Sociedade Civil (CESC), Capítulo Moçambicano do Instituto para Comunicação Social da África Austral (MISA Moçambique) e Fórum das Associações Moçambicanas de Pessoas com Deficiência (FAMOD).

Com o apoio de:

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